António Manuel Zezola na 55.ª Conversa na Taberna
A paixão alimenta a vida
Profissional de restauração, António Manuel Zezola leva a vida muito para além do restaurante O Saraiva. É formado em Engenharia Mecânica e atualmente frequenta um mestrado em Energias, Climatização e Refrigeração. A mecânica é uma paixão que vem desde a adolescência e hoje é um dedicado colecionador de viaturas clássicas. António Manuel deu a conhecer as suas histórias nas Conversas na Taberna, do Museu Rural e do Vinho, no dia 26 de junho.
António Manuel Zezola é um homem de fé. Acredita que a vida se constrói com trabalho e que é de amor que se alimentam os sonhos, os projetos e as relações. Acredita no futuro e acredita que é a criatividade que faz o mundo girar e avançar. Mas o passado tem um importante papel no seu caminho. É lá que abraça as suas raízes e encontra a energia que o faz viver apaixonadamente cada dia da sua vida.
Fazendas de Almeirim é a sua terra natal. Foi aí que passou a sua infância, gozando os tempos de menino entre brincadeiras e muitas vivências passadas na casa dos avós, enquanto a mãe trabalhava na monda do arroz. Esses tempos trazem-lhe “muita saudade”.
Terminou a 4.ª classe em 1963 e, por sugestão do pai, foi estudar para a Escola Industrial de Santarém, tendo aí concluído o 7.º ano, havendo uma forte garantia de vir a poder trabalhar na CUF do Barreiro, mas o 25 de Abril acabou por colocar em causa o “emprego prometido”.
Acabou um ano depois por entrar para a Escola Náutica, onde esteve dois anos. “Era um estudante auto-sustentado. Tocava a minha viola, enquanto músico privativo no restaurante O Saraiva. Fazia muitos serviços, pode dizer-se que ganhava bem”.
O restaurante tinha nessa altura “casa sempre cheia”. Pessoas de vários pontos do país vinham ao Cartaxo com o único propósito de ir ao Saraiva. António Manuel tinha 17 anos quando começou “a olhar para a filha do patrão”.
Do namoro ao casamento foi um passo e, em virtude disso, António Manuel passou a trabalhar no restaurante. “Era tudo muito diferente, trabalhava-se muito. Lembro-me muitas vezes das madrugadas que passávamos a cozer pão. Era duro, mas tínhamos o reverso da medalha, agora não sabemos com o que contar”.
A reputação do restaurante aumentou ainda mais com a criação de um arraial, que passou a ter capacidade para 2500 pessoas. Desses tempos, fica na recordação de muitos os momentos de divertimento passados a pegar a vaca – “que ficou conhecida em todo o país. Todos os fins-de-semana, sem exceção, a ambulância ia lá buscar alguém para o hospital”.
Hoje, é António Manuel e a sua esposa que estão à frente deste empreendimento de restauração. Mas as coisas estão diferentes. Já não há as “grandes enchentes” de outros tempos, mas os novos projetos continuam a surgir.
“Já não há tanto trabalho, mas ainda estamos a investir. Estamos a terminar de construir um auditório para atrair outro tipo de clientes, mais orientados para o mundo empresarial, que podem ali fazer as suas reuniões. Não podemos parar”.
O que lhe dá sustento, é de facto a restauração. Gosta do que faz, mas se pudesse escolher, optava por trabalhar numa área completamente diferente. Ainda que seja conhecido de muita gente, poucos saberão que António Manuel é licenciado em Engenharia Mecânica e está neste momento a fazer um mestrado em Energias, Climatização e Refrigeração. Está inclusive a desenvolver um projeto que consiste em criar energia nuclear a partir da fusão de átomos.
Menos novidade será a sua “grande paixão” por automóveis clássicos. Aliás, desde adolescente que se interessa por mecânica. “Quando eu tinha uns 14 ou 15 anos o meu pai tinha uma mota que avariou. Foi três vezes ao mecânico e ele não conseguiu arranjá-la. Eu disse ao meu pai que ia detetar a avaria e ia pô-la a trabalhar”.
Assim foi, e a mota nunca mais teve problemas. “Sempre gostei de máquinas, sou muito curioso, gosto de montar, desmontar, perceber como trabalham”.
Essa paixão manteve-se ao longo da sua vida, independentemente da área profissional na qual se afirmou. A provar isso, estão as suas cinco “grandes relíquias”, que guarda num armazém que ergueu propositadamente para as conservar: uma mota MZ, que o pai comprou por 16 contos quando ele tinha 16 anos; um Fiat 600 azul bebé de 1971; um Mercedes 190 “rabo de peixe” de 1965; um Buick de 1955, “único em Portugal”; e um Ford A de 1929.
Mas outras “relíquias” são guardadas por António Manuel, não no armazém, mas na sua memória. É com o mesmo prazer que fala dos momentos que passou com grandes vultos da nossa sociedade quando os recebeu no Saraiva. Rui Veloso, Eusébio ou Amália Rodrigues são apenas três nomes de uma extensa lista que se poderia enunciar.
É esta dinâmica, multiplicidade de vivências e paixões que dão força e esperança a António Manuel, contrariando tudo o que se pressagiava aquando do seu nascimento. De um parto que durou quatro dias não faltava quem comentasse: “parece que não quer vir para este mundo ingrato”.