O realizador de “Manhã Submersa” falou da sua relação com os actores, da sua experiência atrás das câmaras e do prazer que sente em transmitir aos outros a paixão pelo cinema
Lauro António foi o convidado de José Raposo para a tertúlia que todos os últimos domingos de cada mês reúne a população à volta de uma figura pública, no bar do Centro Cultural do Cartaxo – José Raposo Convida.
O realizador de “Manhã Submersa” visitou o Cartaxo no dia 28 de Novembro, numa altura em que está a celebrar, simultaneamente, o 30º aniversário desta sua obra e os 50 anos de carreira como crítico, cineasta, professor de cinema, director de festivais e autor de uma vasta obra escrita.
Várias foram as histórias que marcaram Lauro António nestes 50 anos de vida dedicada à paixão pelo cinema – desde o convívio com alguns dos melhores actores nacionais, passando pelas peripécias das filmagens até ao contacto com o público através das crónicas regulares na imprensa ou dos programas de rádio e televisão.
Mas é o cinema que o encanta. “É um trabalho magnífico. Há uma relação muito interessante que se estabelece através da câmara e que me dá muita felicidade”, revelou, caracterizando o actor como “um elemento essencial e uma personalidade fascinante”.
Na sua relação com os actores, Lauro António gosta de lhes dar liberdade para construírem eles próprios as personagens, de acordo com as indicações que ele lhes transmite. É um trabalho que tem “resultado bem” e que quase sempre o surpreende.
“É muito raro as personagens apresentadas pelos actores não serem de acordo com o que quero. Uma das situações que me marcou profundamente foi ver a Eunice aparecer em Manhã Submersa tal e qual como eu a idealizei”, acrescentou o realizador. Este foi, sem dúvida, um dos seus filmes mais marcantes, assim o foram as filmagens. “Foi muito interessante ir para a Serra da Estrela fazer planos daquele clima gélido, quase inóspito”.
Lauro António encenou também peças de teatro, mas este é um trabalho que classifica de “muito sistemático” e, portanto, menos apelativo que o cinema, o qual considera “mais espontâneo”.
A crítica cinematográfica é também uma actividade que o acompanha desde os anos 60, quando iniciou as suas crónicas no Diário de Lisboa, em 1967. Uma actividade “interessante” e que muitas vezes tinha repercussões muito directas nas salas de cinema: “bastava dizermos que um filme era bom para as salas encherem”, revelou.
Neste momento, há um trabalho que lhe dá um gosto especial: leccionar. “Um dos meus prazeres é dar aulas. É ter a oportunidade de passar a paixão aos outros, mas, sobretudo, mantermos a liberdade de escolha. Não é impor o meu modelo de cinema, é ajudá-los a descobrir o seu caminho, o seu cinema. As pessoas ficam diminuídas se não se alargar o horizonte das vastas áreas desse domínio”.
Lauro António lamentou ainda que a partir dos anos 80 “não haja uma perspectiva histórica e estética do cinema português” e que em Portugal não se desenvolva mais o cinema de autor e, sobretudo, a comédia.
“Ao lado de António Silva, Santana ou Maria Matos havia um conjunto de actores invulgares, com um traquejo que vinha da revista – que era uma escola de representar de forma moderna, naquela altura. Esses actores, que tinham um grande contacto com o público na revista, tinham depois no cinema uma espontaneidade muito grande”.
Neste último meio século, Lauro António destacou-se enquanto realizador de cinema e de televisão, crítico e ensaísta de cinema (com mais de cinco dezenas de obras publicadas e com colaboração em numerosas publicações), autor de vários programas de cinema na rádio, autor e encenador de teatro, director de programação de salas de cinema, director de diversos festivais, professor, entre outras funções e actividades.