Por: Ana Fonseca da Luz
Sempre que acabo um texto que me agrada, sinto-me feliz, completa!
Se pudesse, era só o que fazia. Escrevia!
Vou até à janela, para espreitar o dia que amanheceu azul, mas que já acinzentou.
Encosto a cabeça ao vidro frio. Deixo-me ficar assim, por alguns momentos, pedindo a Deus que ninguém me veja neste abandono e de olhar perdido, vendo aquilo que mais ninguém vê.
Largo a janela e percebo que estou cheia de uma felicidade infeliz e que eu sei que não é muito saudável.
Volto à minha secretária, afogada em palavras que preciso escrever para me libertar, para tentar conseguir chegar onde eu sei que nunca vou conseguir. Mas não interessa. Como sou teimosa, tento, uma e outra vez. Quem sabe se um dia não chego lá! Quem sabe se um dia não chego ao que é realmente a essência da minha vida.
O relógio sem ponteiros espreita-me de soslaio, avisando-me de que, apesar de não ter ponteiros, o tempo não volta para trás e que eu acabo de perder mais meia hora de vida. Malvado do relógio! Já não sei se fiz bem em pô-lo ali!
Sempre a chamar-me a atenção para aquilo que eu quero esquecer…
Sentada à secretária, com um texto a meio, sou deliciosamente interrompida para uma conversa que inevitavelmente me remete mais uma vez para o passado. Eu e o passado temos uma relação muito estranha! Agridoce…
Ambos gostamos de ficar assim, pendurados no nada, a divagar sintonias que mais ninguém entende.
É como se o passado teimasse em encostar-se a nós e a ficar assim, à espera de uma resposta que nós não lhe podemos dar.
E assim, durante uma hora, saltitámos entre alegrias e tristezas partilhadas, sem realmente nos apercebermos de que o tempo passava e que deixava um rasto.
Numa corrida contra o tempo, porque o almoço está ao lume, (sempre o tempo!), leio o texto acabadinho de nascer e alegro-me ao perceber que nem todo o tempo é perdido. Ou por outra, às vezes é perdido de maneira agradável. Não volta para trás, mas deixa tatuagens na nossa alma que duram para sempre.
Deixo a minha secretária, mas não deixo de olhar com alegria o relógio sem ponteiros, que me marca uma hora. Uma hora bem passada.
Até sempre !!